Na Idade Média, a tradição de jejuar durante 40 dias e 40 noites entre a Quaresma e a Semana Santa obrigava os mosteiros a esvaziar parte de suas despensas. A carne, que estragaria durante esse período de abstinência, era comida pela população, sendo que a terça-feira era o ápice da comilança. Daí a terça-feira "gorda".
Hoje, com a quantidade de católicos não-praticantes aumentando, há pouco jejum de carne e muita gula dos "prazeres da carne". Como você sabe, o Carnaval deriva da expressão latina "carne vale", que em bom português pode ser traduzido como "vale tudo, inclusive carne"!
Claro que uma festa como essa iria encontrar nos trópicos solo fértil para crescer e se multiplicar, com o todo o duplo sentido, por favor. Em 1549, o Pe. Manuel da Nóbrega enviou uma carta à Portugal para o Pe. Simão Rodrigues contando de uma procissão de Corpus Christi pelas ruas de Salvador que incluiu todas as "danças e invenções alegorias à maneira de Portugal". Entre as danças, havia "coros, músicas, bandeiras, representações figuradas, folias etc".
O Pe. Serafim Leite observou que tais folias eram uma concessão dos jesuítas ao desejo de diversão dos devotos e que elas não tinham caráter religioso, mas "de simples e honesta diversão popular".
Em 1585, o padre jesuíta José de Anchieta escreveu irritado sobre o gosto por diversão em detrimento dos estudos e trabalhos da incipiente sociedade brasileira:
"Os estudantes desta terra, além de serem poucos, também sabem pouco, por falta de engenhos e não estudarem com cuidado". Para piorar, ele achava que o ambiente local era pouco propício ao interesse pela ciência: "... nem a terra dá de si, por ser relaxada, remissa e melancólica, e tudo se leva em festas, cantar e folgar".
Reconheço que a única que eu gosto no Carnaval é o feriado, e por isso mesmo eu só acrescentaria uma frase, que de todos já é bem conhecida: "Nada há de novo debaixo do sol".
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