Lembra das sereias cujas vozes aveludadas vozes atraíam irresistivelmente os combatentes de Ulisses, o herói com algum caráter? As musas irresistíveis de hoje são a fama midiática e o desejo de ser celebridade. Quando a fama chama, não há decência, palavrinha ultrapassada, hein?, que resista.
Recentemente, um casal (e mais um sócio) aprontou uma típica jogada de marketing para divulgar um projeto de série para TV fazendo voar um balão que estaria carregando por descuido um de seus filhos. O alarme foi disparado, as imagens se espalharam, o serviço de emergência foi mobilizado, mas poucos dias depois a farsa foi descoberta. Esse golpe publicitário aparentemente inspirado nas aventuras da animação Up, em que uma criança e um ancião voam desastradamente numa casa-balão, virou caso de polícia porque envolveu, além da mentira descarada, uma criança. E criança perdida no espaço só pode nas ficções da TV.
Se Ulisses amarrou o próprio corpo no mastro da jangada para não se atirar no mar das sereias de voz maviosa voz, o sócio-pai, amarrando (metaforicamente) seu filho a um balão, demonstrava não ter resistido ao doce canto da sereia-fama e da sereia-grana (e nem sempre eventualmente, da sereia-cama). Agora responderá a processo judicial, coisa que não existe nas odisséias gregas de Ulisses.
As peripécias dos anônimos em busca da fama não merecem uma Ilíada, mas têm dimensões homéricas. Basta ver a quantidade de gente que se inscreve nas edições de reality shows que tomaram conta da TV mundial. Ou ainda a empolgação que muita gente mostra quando passa por trás de alguém sendo entrevistado na rua, ou as horas dedicadas a criar perfis e postar imagens pessoais no Orkut ou no Facebook.
O marketing pode ser planejado numa mesa, como fizeram os sócios da “farsa do balão”, ou ser completamente involuntário, como no caso da cantora Vanusa, cuja interpretação "remixada" do Hino Nacional andou lhe valendo novos convites para shows. Com premeditação ou não, importa dizer que esses eventos são, na verdade, pseudoeventos. São eventos fabricados para ter o significado de um evento que mereça a cobertura da mídia.
Assim, pouco interessa o fato; interessa a cobertura midiática do fato. A primeira-dama brincando de bambolê, o engarrafamento infinito, os estudantes sonolentos nas aulas do início do horário de verão, o craque de futebol flagrado numa boate, o cantor na praia, a ex-BBB no shopping: se o jornal noturno transmitiu é porque o fato era digno de nota, se os vespertinos sensacionalistas mostraram é porque o evento é urgente, se o portal de um grande conglomerado noticiou então o acontecido é importante .
Verdade ou ilusão também pouco interessariam, o que importa é a versão do fato que cada jornal, rádio ou TV apresenta. Sarney discursa no plenário: para qualquer jornal do país esse discurso não terá respondido às questões mais candentes, exceto para o jornal O Estado do Maranhão, que logrará a notícia de que Sarney fez uma contundente defesa de sua “ilibada conduta política”. O MST ocupa uma fazenda: para qualquer periódico do país esse ato representará o caráter hostil e vândalo dos movimentos sociais, exceto para uns parcos blogueiros, que acusarão a adulteração midiática dos reais motivos das mobilizações coletivas.
Ocorre, aqui, uma transubstanciação do evento: de pseudoevento ou fato relevante, a notícia, quando veiculada pelos canais de comunicação hegemônicos, converte-se em verdade senhorial, sendo que os muxoxos dos apresentadores após a divulgação das imagens do evento equivalem ao polegar dos césares no coliseu. Assim, quando os periódicos mais vendidos estão certos, eles sempre estiveram certos. Quando estão equivocados, eles ainda estão certos, até porque, na era da ausência fabricada de Deus, vox media, vox dei, a voz da mídia é a voz onipresente e onisciente.
Enquanto a voz do povo seria a famigerada opinião pública, a voz da mídia é a indispensável opinião publicada. A voz afônica das ruas será apenas pública, porque publicada mesmo é a opinião do pensamento ideológico do editor, que não raro é a expressão dos investimentos financeiros do sócio majoritário.
E quanto às notícias do jogador na boate, do cantor na praia e da ex-BBB no shopping, bem, me acordem quando eles forem flagrados numa biblioteca.
Se Ulisses amarrou o próprio corpo no mastro da jangada para não se atirar no mar das sereias de voz maviosa voz, o sócio-pai, amarrando (metaforicamente) seu filho a um balão, demonstrava não ter resistido ao doce canto da sereia-fama e da sereia-grana (e nem sempre eventualmente, da sereia-cama). Agora responderá a processo judicial, coisa que não existe nas odisséias gregas de Ulisses.
As peripécias dos anônimos em busca da fama não merecem uma Ilíada, mas têm dimensões homéricas. Basta ver a quantidade de gente que se inscreve nas edições de reality shows que tomaram conta da TV mundial. Ou ainda a empolgação que muita gente mostra quando passa por trás de alguém sendo entrevistado na rua, ou as horas dedicadas a criar perfis e postar imagens pessoais no Orkut ou no Facebook.
O marketing pode ser planejado numa mesa, como fizeram os sócios da “farsa do balão”, ou ser completamente involuntário, como no caso da cantora Vanusa, cuja interpretação "remixada" do Hino Nacional andou lhe valendo novos convites para shows. Com premeditação ou não, importa dizer que esses eventos são, na verdade, pseudoeventos. São eventos fabricados para ter o significado de um evento que mereça a cobertura da mídia.
Assim, pouco interessa o fato; interessa a cobertura midiática do fato. A primeira-dama brincando de bambolê, o engarrafamento infinito, os estudantes sonolentos nas aulas do início do horário de verão, o craque de futebol flagrado numa boate, o cantor na praia, a ex-BBB no shopping: se o jornal noturno transmitiu é porque o fato era digno de nota, se os vespertinos sensacionalistas mostraram é porque o evento é urgente, se o portal de um grande conglomerado noticiou então o acontecido é importante .
Verdade ou ilusão também pouco interessariam, o que importa é a versão do fato que cada jornal, rádio ou TV apresenta. Sarney discursa no plenário: para qualquer jornal do país esse discurso não terá respondido às questões mais candentes, exceto para o jornal O Estado do Maranhão, que logrará a notícia de que Sarney fez uma contundente defesa de sua “ilibada conduta política”. O MST ocupa uma fazenda: para qualquer periódico do país esse ato representará o caráter hostil e vândalo dos movimentos sociais, exceto para uns parcos blogueiros, que acusarão a adulteração midiática dos reais motivos das mobilizações coletivas.
Ocorre, aqui, uma transubstanciação do evento: de pseudoevento ou fato relevante, a notícia, quando veiculada pelos canais de comunicação hegemônicos, converte-se em verdade senhorial, sendo que os muxoxos dos apresentadores após a divulgação das imagens do evento equivalem ao polegar dos césares no coliseu. Assim, quando os periódicos mais vendidos estão certos, eles sempre estiveram certos. Quando estão equivocados, eles ainda estão certos, até porque, na era da ausência fabricada de Deus, vox media, vox dei, a voz da mídia é a voz onipresente e onisciente.
Enquanto a voz do povo seria a famigerada opinião pública, a voz da mídia é a indispensável opinião publicada. A voz afônica das ruas será apenas pública, porque publicada mesmo é a opinião do pensamento ideológico do editor, que não raro é a expressão dos investimentos financeiros do sócio majoritário.
E quanto às notícias do jogador na boate, do cantor na praia e da ex-BBB no shopping, bem, me acordem quando eles forem flagrados numa biblioteca.
Comentários
graças a Deus por esse blog! :)
bom fim de semana Joêzer
shalom!
bom fim e bom começo de semana pra você!