Há uns dois anos, em conversa sobre religiões, um dos interlocutores falou sobre Deus assim: "Esse Deus fica exigindo reverência e adoração só pra Ele, quer que todo mundo se humilhe e grita: se ajoelhem!" Houve um silêncio na roda, eu fiquei impressionado com a súbita cólera na fala do amigo e me faltou palavras pra dizer a ele que essa não é a ideia que tenho de Deus. O prazer do cristão deve ser andar humildemente com seu Senhor, como diz a Bíblia. Cristãos genuínos gostam de servir a Deus e, para eles, adorá-lO nada mais é que reconhecer e ser grato pelos atos poderosos de salvação dos quais se consideram não merecedores.
O jornalista português João Pereira Coutinho, na Folha de S. Paulo (4/11/09), identifica que alguns intelectuais são sistematicamente agressivos em relação às religiões (e regularmente acintosos quanto ao cristianismo) não porque descreem simplesmente na existência do Deus bíblico, mas porque desenvolveram um ódio ao Deus bíblico, e acabam falando de Deus como se acreditassem que Ele exista e seja um mal a ser extirpado da vida humana:
O ateísmo de Saramago faz lembrar uma história. Um dia perguntaram a Kingsley Amis por que motivo ele não acreditava em Deus. Amis fez cara de enfado e, razoavelmente sóbrio, explicou: "Não é bem não acreditar em Deus; é mais detestá-lO".
Tal como Amis, Saramago não descrê em Deus; ele simplesmente detesta-O com uma força só comparável à devoção dos verdadeiramente fanáticos. Nos seus livros "heréticos", o Mal não está apenas na religião tradicional e organizada. O Mal está na fonte. Leiam "O Evangelho Segundo Jesus Cristo": Deus é o vilão, não Jesus. Pelo contrário: Jesus só merece a empatia do autor, que descreve o destino daquele homem, condenado a sofrer às mãos do Pai, com verdadeira caridade "cristã". Deus, como sempre, é o supremo criminoso.
A atitude é profundamente religiosa. E Saramago é, ironia, a criatura mais religiosa da literatura contemporânea. Não somos religiosos apenas porque amamos Deus. Somos religiosos até quando O detestamos: o nosso ódio, como Graham Greene mostrou no magistral "Fim de Caso", é também uma forma de afirmação. De afirmação pela negação. "Eu sou o espírito que nega!", exclama Mefistófeles ao dr. Fausto. Saramago também. É por isso que Saramago e os fanáticos religiosos que ele tanto critica falam a mesma linguagem. Ainda que habitem pontos opostos do diálogo.
Comentários
espero q tudo esteja correndo em santa paz
muito boa a seleção da análise
hoje mesmo na tv me deparei com o questionamento da fé dos cristãos pelo jornalista global alexandre garcia, num seminário na faculdade de direito da unb. esse tipo é mais comum, mas me importa menos. o q faço questão de defender é a justiça q há em Deus até mesmo qdo requer a Si a adoração.
sabe? tenho experimentado q o melhor caminho pra se achar respostas da parte de Deus é começar sem duvidar. infelizmente as pessoas não parecem buscar respostas, mas ocasião pra recriminar a Luz e o q nela está (Jo 3:20).
realmente não parece ser uma atitude humilde Deus desejar ser venerado em detrimento de outros deuses e de pessoas, mas talvez se analisássemos alguns versos entenderíamos a rea pretensão de Deus. como exemplo, em Jo 8:54, diz "Jesus respondeu: Se eu me glorifico a mim mesmo, a minha glória não é nada; quem me glorifica é meu Pai, o qual dizeis que é vosso Deus."
no verso 16:14 Jesus fala que o Espírito consolador o há de glorificar
eu entendo q o Espírito glorifica o Pai e o Filho; o Filho, o Pai e o Espírito; e o Pai, o Filho e o Espírito.
em filipenses 2, paulo fala de Jesus como uma figura humilde, sendo a imagem idêntica de Deus. é um místério, mas Deus pode ser humilde, glorioso e mesmo assim Justo. Aleluia!
Shalom!
creio tb que um bom caminho para achar respostas sobre Deus é começar a duvidar. sim, duvidar. duvidar das próprias certezas, duvidar do relativismo, duvidar de que Deus é esse ser injusto e cruel que tentam pintar.
a outra atitude é, como vc disse bem, ser humilde. humildade para tentar entender que o universo pode não ser desprovido de sentido, humildade para entender a existência de um plano de redenção e outros mistérios.
boas palavras as suas, loren.