Agora que Michel Teló lançou a Macarena do começo do século, o
cidadão brasileiro anda indignado com o sucesso do rapaz. Não adiantou. O hit Ai, se eu te pego globalizou e já conta
com versão pra inglês requebrar: Oh, if I catch you. Mas poderia se chamar
“Nobody deserves it” (Ninguém merece).
Nosso último representante a ser vertido para a língua de
Shakespeare tão rapidamente foi Tom Jobim. Muito salão de espera ao redor do
mundo ainda toca The girl from Ipanema, One note samba e Waters of March.
Tom preocupava-se em transportar para a letra em inglês a mesma carga de poesia
e aliteração que a canção possuía em português: na canção Corcovado, aquela
famosa primeira frase, “um cantinho, um violão”, se tornou “Quiet night of
quiet stars”. Isso é trabalho de versão. Trabalho de tradução seria
simplesmente escrever “A little corner, a guitar”.
Mas aqui também é a terra do gênio de Falcão, um caso raro
de bregueiro contemporâneo que não se leva a sério. Ele cometeu uma tradução
para o inglês do sucesso de Waldick Soriano, Eu não sou cachorro não.
Juntando a paródia com a vontade de rir, Falcão nos legou o clássico I’m not
dog no.
A única diferença entre Michel Teló e Falcão é que o
primeiro não usa uma flor gigante cravada no terno escalafobético. Duvida? Na
versão em inglês de Oh, if I catch you, os versos “Nossa, assim você me mata”
transubstanciaram-se em “Wow, this way you’re gonna kill me”.
O co-autor dessa versão é o Google Translator. Logo virão versões
de sucessos recentes como Each one on his square (cada um no seu quadrado), ou
de clássicos como Hold the tchan. E assim a música brasileira, digo, a vaca
vai pro brejo. Ou “the cow went to the swamp” (Millôr Fernandes).
Pegaram o Michel Teló pra Judas, como se ele tivesse traído
a cultura da pátria. Os nostálgicos, que são aquelas pessoas de memória curta, dizem
que não era assim no tempo deles. Já esqueceram que, há 30 anos, Gretchen
cantava em francês, rebolava em português e ainda faturava em dólar. E na década
de 1970, o paulista Maurício Alberto fazia letras direto em inglês, como a do
sucesso de todos os bailes de quinze anos da época, “Feelings”. Para evitar o
preconceito do mercado internacional, Maurício Alberto virou Morris Albert.
Se fosse naquele tempo,
Michel Teló seria só o nome artístico de alguém chamado Miguel Teles.
O problema não é o hit parade que toca nas rádios e TVs dos últimos séculos. É só a gente não ouvir e ver certas emissoras. O problema é a ditadura do hit parade que silencia qualquer outro estilo de música que não esteja "na moda".
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Para outros grandes vultos nacionais idolatrados e odiolatrados, confira a seção "Everybody loves/Todo mundo odeia".
Comentários
....bolas de feno rolando....
Ando muito por fora da atual música popular nacional. Mas pelo pouco que sei, me parece muito metida e pedante.
Sou mais o João Alexandre!