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o ano em que não fomos mais os mesmos

Música, tecnologia, guerra, direitos civis, religião: de tempos em tempos, o modo de pensar e agir sobre isso tudo muda. Se alguém quiser saber quando foi que nossa sociedade começou a ser do jeito que é hoje, é preciso recuar até 1962. Há 50 anos, deixamos de ser os mesmos.

Em fevereiro de 1962, John Glenn tornava-se o primeiro astronauta americano cruzando a órbita da Terra. O próximo passo seria a chegada à Lua e o resto é história (ou uma tremenda "estória").

A corrida espacial disputada por americanos e soviéticos era acalorada. Enquanto a isso, a Guerra Fria também esquentava naquele ano. Em 14 de outubro, um avião espião dos Estados Unidos fotografou quatro lançadores de mísseis em Cuba, desde a época, uma ilha comunista rodeada de capitalismo por todos os lados. O mundo prendeu o fôlego por 13 dias esperando o Armagedom atômico.  Só no dia 28, o premiê soviético Nikita Kruschev declarou que as armas seriam desmontadas, encaixotadas e enviadas de volta à União Soviética.

Enquanto o mundo respirava aliviado, a construção do Muro de Berlim, iniciada em junho, seguia firme. O muro era o lado concreto da divisão da Europa em dois blocos antagônicos.

O mundo do cinema não deixou passar esse tema em brancas bilheterias. Em 1962, era lançado o primeiro filme da série 007. Em agosto, Marilyn Monroe tinha sido encontrada morta vítima de uma superdose de Nembutal. O cinema perdia uma estrela e lançava um astro:  o espião 007. Mesmo que você não tenha assistido a nenhum filme da série, você conhece a música-tema.

Falando em música, 1962 foi um divisor de águas. Em abril, Bob Dylan apresentava sua música folk politizada e poética em Nova York. Novos ventos sopravam. As mentes mais aguçadas entendiam o recado de Dylan.

Em 5 de outubro, quem entendia o recado eram os corações e pés dos mais jovens. A canção Love me Do, dos Beatles, estreava nas rádios e seu sucesso criava um novo código de comportamento. Uma introdução de gaita de bolso, um refrão simples e pegajoso, uma letra exaltando o amor e a música pop seria a tônica dominante da mídia.

Nem só de entretenimento e Guerra Fria vivia 1962. A luta dos negros pelos direitos civis não arrefecia, mesmo que, no dia 6 de agosto, Nelson Mandela estivesse sendo preso pelo regime do apartheid na África do Sul. Nos Estados Unidos, não sem ferrenha oposição racista, em 1º de outubro, o jovem James Meredith tornava-se o primeiro estudante negro a matricular-se na Universidade do Mississipi.


Para garantir que ele caminhasse com segurança até a universidade, foi preciso escolta policial federal e oficial de justiça (foto). Durante todo o trajeto, Meredith foi insultado por brancos que repeliam sua presença ali. 

A busca por maior liberdade de comportamento e o ativismo social estiveram presentes nas reuniões do Segundo Concílio do Vaticano. Convocado pelo para João XXIII, o concílio era um processo de atualização (aggiornamento) da Igreja. Houve orientações quanto a mudanças na liturgia e no compromisso social da igreja. Embora o futuro papa João Paulo II tenha recuado em algumas das propostas, a modernização da Igreja Católica teria impacto em várias esferas políticas, sociais e religiosas.

Por último, ao terminar de ler este texto na web, você pode ter certeza de que faz parte de uma revolução na mentalidade ocidental que teve impulso naquele ano. Até porque, foi em 3 de novembro de 1962 que o jornal New York Times estampou a notícia sobre um tal de “computador pessoal”.

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