O delegado Protógenes foi ao cinema ver um filme sobre um
ursinho de pelúcia. E levou seu filho de 11 anos. Como acontece com 90% dos
espectadores, ele não se informou sobre a história do filme e só lá dentro foi
descobrir que o ursinho não tinha nada de pelúcia. Era, na verdade, um ursinho
de malícia. O ursinho fuma, bebe, fala palavrões, cai na gandaia. Ou
seja, não deve morar com os Ursinhos Carinhosos.
Tem crítico de jornal vendo o filme como uma fábula sobre
a adolescência sem fim dos adultos de hoje, que casam com a irresponsabilidade
e o hedonismo até que a maturidade os separe. Não sei se o filme é bom ou ruim, mas acho que não vale a pena descobrir. O que todos sabem é que o delegado
Protógenes levou seu filho de 11 anos para ver um filme qualificado como não
recomendado para menores de 16 anos, e que saiu do cinema esbaforido pedindo pelo Twitter a censura
do filme em todo o território nacional.
Essa é a história do Delegado Mãos-de-Tesoura. Parece uma fábula, mas o que se segue é inteiramente baseado em minhas especulações.
Ao chegar em casa, foi direto para o laptop. Para você ver
que não importa a patente, todos são mordidos pela vontade de falar da vida
pessoal aos 4 ventos e às 100 redes sociais. O delegado queria proibir o filme.
Mais tarde, pensou melhor (leia-se: os internautas discordaram veementemente da
vontade do delegado) e disse que iria sugerir aos órgãos competentes a mudança
de faixa etária apropriada para o filme, de 16 para 18 anos.
O caso tomou proporções nacionais e o delegado se viu no
papel de paladino da moral e dos bons costumes. Pelo jeito, ele crê que as
diabruras de um ursinho de malícia que não trabalha, não estuda e se diverte é
um mau exemplo para os espectadores em idade escolar. Disso, nenhum pai vai
discordar. [Considerando que cada pai, por ter sido adolescente, lembra muito bem a distância entre o que o pai recomendava e o que o filho fazia].
É claro que o “Seu” delegado deve achar que a roubalheira da
classe política, o sucateamento da escola pública e a glamourização dos astros da
TV e do futebol não são bons estímulos para nossa linda juventude. Mas ele
prefere não comentar.
É claro que o “Seu” delegado também prefere não comentar o
que raios estava pensando quando entrou, junto com seu filho de 11 anos, num
cinema que exibia um filme impróprio para menores de 16 anos.
É claro que o honorável delegado não imaginava que a
repercussão desse caso iria aumentar o número de curiosos que foram ver o tal "filme que o delegado quer proibir". Nada como um escândalo para promover um
filme. Melhor para os produtores do filme que não gastaram um dólar furado. Marketing
involuntário e gratuito: só as autoridades indignadas são capazes de fazer.
Moral mínima: se for zelar pela moral e pelos bons costumes,
tenha o cuidado de não servir de marketing.
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