Pular para o conteúdo principal

dinheiro na meia é vendaval

Numa tarde qualquer em Brasília, dois homens e seus podres poderes se reúnem para um encontro comum entre políticos da cidade. Um deles, o remetente, carrega consigo várias boladas de dinheiro para entregar ao destinatário que o espera numa dessas salas próprias para a prática também comum do pagamento de propina. Propina é o montante monetário em espécie servido a mandatários políticos como gratidão pelas intercessões passadas ou futuras junto ao caixa de financiamento de obras públicas.

Esse encontro nada casual tinha tudo para ser mais um encontro oculto entre tantas outras ocultações da vida não fosse a presença de uma câmera, também oculta, registrando a venda da alma política ao diabo da propina. Flagrados com a mão na massa de notas, os envolvidos já começaram a jurar inocência, a acusar chantagem, a espalhar em comunicados à imprensa de que tudo não passa de um grande mal-entendido.

Tarde demais. Uma imagem vale mais que mil advogados.

A quantidade de envolvidos nesse escândalo político aponta para uma velha prática de nome recente: o mensalão. Como é de praxe em todo mensalão, o problema não é o dinheiro, mas a falta de espaço para esconder tanto dinheiro.

Há alguns anos, um deputado foi pego com dinheiro escondido na cueca, dando conotações literais ao vulgo e chulo “cofrinho”. Desta vez, as notas também foram alocadas entre as partes, mas foram ainda revelados novos lugares de depósito no multifuncional figurino de político, como o já tradicional terno com bolsos de fundo falso e as meias.

Tem gente que não sabe o trabalho que dá aos estilistas do alto escalão e do baixo clero de Brasília a confecção de um figurino que pareça lícito mas que possa comportar a grana ilícita.

São meias com boca larga para facilitar a rápida introdução da bufunfa e tecido flexível que resista à pressão do montante das notas; são calças com bainha retrátil para abrigar o faz-me-rir sem o manuseio do zíper, bolsos de fundo sem fim e cós que suporte o peso de uma cueca portando a vergonha dos dólares e outras vergonhas.

Como nesses escândalos hipocrisia pouca é bobagem, entre os envolvidos na corrupção estão dois deputados ligados a igrejas evangélicas. Em um dos vídeos que flagaram a negociata, eles chegam ao ponto final da blasfêmia ao fazer uma oração por mais essa graça alcançada. Pessoas que escondem dinheiro na meia são tão corruptas quanto aqueles que se escondem no nome de igrejas para aparentar inocência presumida.

Não pense que a presença das microcâmeras vá inibir a falta de escrúpulos de alguém. Ao contrário, ser filmado até piora as coisas. Os excelentíssimos começam a agir ainda mais escancaradamente como se estivessem num reality show do tipo "quem quer ser um milionário corrupto?"

Não é à toa que já se pergunta antes de fechar a tramoia:
- Com câmera ou sem câmera?
- Qual a diferença?
- Com câmera é mais caro.
- Não devia ser o contrário? O perigo de ser filmado não vale o risco!
- O amigo sabe quanto custa uma inserção no horário nobre dos telejornais?
- Puxa vida!
- Não queres ouvir o William Bonner pronunciando teu nome?
- Só se for agora!

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

o mito da música que transforma a água

" Música bonita gera cristais de gelo bonitos e música feia gera cristais de gelo feios ". E que tal essa frase? " Palavras boas e positivas geram cristais de gelo bonitos e simétricos ". O autor dessa teoria é o fotógrafo japonês Masaru Emoto (falecido em 2014). Parece difícil alguém com o ensino médio completo acreditar nisso, mas não só existe gente grande acreditando como tem gente usando essas conclusões em palestras sobre música sacra! O experimento de Masaru Emoto consistiu em tocar várias músicas próximo a recipientes com água. Em seguida, a água foi congelada e, com um microscópio, Emoto analisou as moléculas de água. Os cristais de água que "ouviram" música clássica ficaram bonitos e simétricos, ao passo que os cristais de água que "ouviram" música pop eram feios. Não bastasse, Emoto também testou a água falando com ela durante um mês. Ele dizia palavras amorosas e positivas para um recipiente e palavras de ódio e negativas par

paula fernandes e os espíritos compositores

A cantora Paula Fernandes disse em um recente programa de TV que seu processo de composição é, segundo suas palavras, “altamente intuitivo, pra não dizer mediúnico”. Foi a senha para o desapontamento de alguns admiradores da cantora.  Embora suas músicas falem de um amor casto e monogâmico, muitos fãs evangélicos já estão providenciando o tradicional "vou jogar fora no lixo" dos CDs de Paula Fernandes. Parece que a apologia do amor fiel só é bem-vinda quando dita por um conselheiro cristão. Paula foi ao programa Show Business , de João Dória Jr., e se declarou espírita.  Falou ainda que não tem preconceito religioso, “mesmo porque Deus é um só”. Em seguida, ela disse que não compõe sozinha, que às vezes, nas letras de suas canções, ela lê “palavras que não sabe o significado”. O que a cantora quis dizer com "palavras que não sei o significado"? Fiz uma breve varredura nas suas letras e, verificando que o nível léxico dos versos não é de nenhu

Nabucodonosor e a música da Babilônia

Quando visitei o museu arqueológico Paulo Bork (Unasp - EC), vi um tijolo datado de 600 a.C. cuja inscrição em escrita cuneiforme diz: “Eu sou Nabucodonosor, rei de Babilônia, provedor dos templos de Ezágila e Égila e primogênito de Nebupolasar, rei de Babilônia”. Lembrei, então, que nas minhas aulas de história da música costumo mostrar a foto de uma lira de Ur (Ur era uma cidade da região da Mesopotâmia, onde se localizava Babilônia e onde atualmente se localiza o Iraque). Certamente, a lira integrava o corpo de instrumentos da música dos templos durante o reinado de Nabucodonosor. Fig 1: a lira de Ur No sítio arqueológico de Ur (a mesma Ur dos Caldeus citada em textos bíblicos) foram encontradas nove liras e duas harpas, entre as quais, a lira sumeriana, cuja caixa de ressonância é adornada com uma escultura em forma de cabeça bovina. As liras são citadas em um dos cultos oferecidos ao rei Nabucodonosor, conforme relato no livro bíblico de Daniel, capítulo 3. Aliás, n