A reportagem de Janaína Linhares no Jornal do Brasil de 15 de junho revela que o funk caiu também nas graças da Igreja Católica. Segundo a repórter, “numa tentativa de reverter a perda de fiéis, [...] algumas paróquias da cidade decidiram colocar em prática uma espécie de Plano B para lá de excêntrico: transformar as missas em uma grande festa e, assim, aumentar o rebanho jovem. E foi assim, ao som do funk, do hip hop e da música eletrônica, que a comemoração católica batizada de Cristoteca se tornou uma mania”.
A jornalista notou que o público era predominantemente jovem e, apesar da ausência bebidas alcoólicas e cigarros, ela comparou o evento a “uma noitada carioca” embalada por “palmas e coreografias ao som da celebração à palavra de Deus”.
O padre Jorge Bispo considera a Cristoteca “um trabalho de resgate com a juventude”, motivo da utilização das “músicas que eles gostam, só que com letras católicas”.
Ainda segundo a reportagem, “apesar da animação, nem tudo no evento se resume à música. A festa, que começa às 22h e se estende até as 5h, pára por volta da meia-noite para que seja realizada a missa. Depois da celebração, os DJs de Cristo retomam o comando das carrepetas e, enquanto a música volta a agitar a pista, em tendas brancas espalhadas pelo local acontecem orações, intercessão com Santíssimo exposto, aconselhamentos espirituais e confissões com vários sacerdotes convidados”.
Alessandro Gomes, que vai à Cristoteca desde a sua criação, diz que o clima liberal da celebração não tira o foco religioso do evento. “Gosto muito de beber cerveja”, diz o entrevistado, “mas nesse caso não tenho vontade e acho que é por respeito mesmo, [e na] Cristoteca não é legal ficar bêbado”. Outro freqüentador conta que “a missa se renovou e hoje é muito diferente. As pessoas deixaram de lado a vergonha e assumiram que é legal ser cristão”.
A jornalista notou que o público era predominantemente jovem e, apesar da ausência bebidas alcoólicas e cigarros, ela comparou o evento a “uma noitada carioca” embalada por “palmas e coreografias ao som da celebração à palavra de Deus”.
O padre Jorge Bispo considera a Cristoteca “um trabalho de resgate com a juventude”, motivo da utilização das “músicas que eles gostam, só que com letras católicas”.
Ainda segundo a reportagem, “apesar da animação, nem tudo no evento se resume à música. A festa, que começa às 22h e se estende até as 5h, pára por volta da meia-noite para que seja realizada a missa. Depois da celebração, os DJs de Cristo retomam o comando das carrepetas e, enquanto a música volta a agitar a pista, em tendas brancas espalhadas pelo local acontecem orações, intercessão com Santíssimo exposto, aconselhamentos espirituais e confissões com vários sacerdotes convidados”.
Alessandro Gomes, que vai à Cristoteca desde a sua criação, diz que o clima liberal da celebração não tira o foco religioso do evento. “Gosto muito de beber cerveja”, diz o entrevistado, “mas nesse caso não tenho vontade e acho que é por respeito mesmo, [e na] Cristoteca não é legal ficar bêbado”. Outro freqüentador conta que “a missa se renovou e hoje é muito diferente. As pessoas deixaram de lado a vergonha e assumiram que é legal ser cristão”.
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A questão não é discutir se há honestidade espiritual ou não nas estratégias formuladas pelos líderes religiosos ou se o público-alvo é de fato atingido pelas mensagens musicalizadas. Porém, há alguns pontos a ponderar em tais propostas, pontos estes que são logo atacados com frases do tipo “é melhor isso do que a balada secular”, ou “as igrejas estão atraindo os jovens”, e ainda, “o jovem religioso precisa se divertir”.
Se colocarmos uma interrogação ao final das frases mencionadas, pode-se ter uma pausa para reflexão antes que se entre no clima do “batidão”. Primeira: é melhor isso do que a balada secular? O “isso” nada mais seria que a reprodução dos festejos dos baladeiros noturnos, com a simples retirada do álcool e do fumo. Faz-se uma missa à meia-noite e mexe-se as cadeiras até o galo cantar três vezes, para então sair dali com a sensação de que ser cristão é “legal”, é “massa”, é “da hora”?
Segunda interrogação: as igrejas estão atraindo os jovens? No processo de pesquisa para a minha dissertação, li, ouvi e estudei os novos padrões de atração de fiéis, e a palavra-chave é mesmo “atração”. Se está escrito que “Eu [Cristo], quando for levantado da Terra, atrairei todos a Mim”, é fato que, hoje, quando o funk levanta poeira, atrai muita gente. Assiste-se atualmente a um modelo de conservação e atração de público jovem para reuniões em que há muita religiosidade, mas pouca religião; há versos bíblicos lidos a esmo, mas pouco “examinai as Escrituras”. Cantores de grande vendagem, músicas pop-religiosas, luzes estrobocópicas fascinam o jovem público que encontra nas grandes concentrações religiosas em logradouros públicos ou em salões particulares um genérico das baladas e shows populares.
Denomino de “genérico” porque o princípio ativo é o mesmo. Isto é, aquilo que desencadeia as reações psicossomáticas (em português, as reações mentais e corporais) do público não são as letras, mas a intensidade sonora e a capacidade dinamogênica do ritmo e da canção.
A questão não é discutir se há honestidade espiritual ou não nas estratégias formuladas pelos líderes religiosos ou se o público-alvo é de fato atingido pelas mensagens musicalizadas. Porém, há alguns pontos a ponderar em tais propostas, pontos estes que são logo atacados com frases do tipo “é melhor isso do que a balada secular”, ou “as igrejas estão atraindo os jovens”, e ainda, “o jovem religioso precisa se divertir”.
Se colocarmos uma interrogação ao final das frases mencionadas, pode-se ter uma pausa para reflexão antes que se entre no clima do “batidão”. Primeira: é melhor isso do que a balada secular? O “isso” nada mais seria que a reprodução dos festejos dos baladeiros noturnos, com a simples retirada do álcool e do fumo. Faz-se uma missa à meia-noite e mexe-se as cadeiras até o galo cantar três vezes, para então sair dali com a sensação de que ser cristão é “legal”, é “massa”, é “da hora”?
Segunda interrogação: as igrejas estão atraindo os jovens? No processo de pesquisa para a minha dissertação, li, ouvi e estudei os novos padrões de atração de fiéis, e a palavra-chave é mesmo “atração”. Se está escrito que “Eu [Cristo], quando for levantado da Terra, atrairei todos a Mim”, é fato que, hoje, quando o funk levanta poeira, atrai muita gente. Assiste-se atualmente a um modelo de conservação e atração de público jovem para reuniões em que há muita religiosidade, mas pouca religião; há versos bíblicos lidos a esmo, mas pouco “examinai as Escrituras”. Cantores de grande vendagem, músicas pop-religiosas, luzes estrobocópicas fascinam o jovem público que encontra nas grandes concentrações religiosas em logradouros públicos ou em salões particulares um genérico das baladas e shows populares.
Denomino de “genérico” porque o princípio ativo é o mesmo. Isto é, aquilo que desencadeia as reações psicossomáticas (em português, as reações mentais e corporais) do público não são as letras, mas a intensidade sonora e a capacidade dinamogênica do ritmo e da canção.
Palavras como funk e gospel, axé e gospel ou dance e gospel deixaram de ser termos inconciliáveis e passaram a ditar o índice de maior ou menor atratividade jovem. Os cantores, auto-denominados ‘levitas’, dão autógrafos, têm comunidades concorrentes no orkut (com pesquisas tipo ‘quem canta melhor’), e reproduzem acriticamente o modelo de comunicação dos astros pop por meio de sua postura no palco, seus comandos de voz (‘tira o pé do chão’) e seus figurinos. Além disso, são recebidos nos shows com estridência por um público que também reproduz o comportamento de fãs histéricos do mundo musical pop.
As letras religiosas seriam o diferencial? As letras podem até ajudar a derreter corações de pedra, mas elas submergem na atmosfera de rave criada para entreter e divertir. Numa perspectiva a ser mais estudada, as letras se parecem mais com mensagens subliminares, tal sua irrelevância diante do ritmo, do volume sonoro e do ambiente. Numa perspectiva mais evidente, embora as letras apresentem temas da vida evangélica, a embalagem melódica e de arranjo reproduz os estilos musicais da moda e a indústria gospel imita o caráter de atração jovem e promoção musical da indústria fonográfica pop, estimulando o comportamento de baladeiro e fã por parte do jovem fiel.
Por último: o jovem religioso precisa se divertir. Ora, isso é elementar. Afinal, sem um pouco de lazer, recreação e leve entretenimento não há cristão que suporte o rojão contemporâneo. Contudo, quando a diversão deixa de ser um momento da semana para se tornar o estilo de vida, algo está se perdendo na caminhada, e este algo pode ser um sentido mais profundo do que é conversão. Se conversão significa mudança de direção, como ainda repetir os maneirismos de interpretação, a histeria fanática, as caras e bocas, os adereços e figurino dos artistas, as melodias e arranjos da música pop mais descartável da mídia?
“Haja entretenimento” – o mandamento da nossa sociedade do espetáculo passou a ser a palavra de ordem para a sobrevivência das igrejas na modernidade.
As letras religiosas seriam o diferencial? As letras podem até ajudar a derreter corações de pedra, mas elas submergem na atmosfera de rave criada para entreter e divertir. Numa perspectiva a ser mais estudada, as letras se parecem mais com mensagens subliminares, tal sua irrelevância diante do ritmo, do volume sonoro e do ambiente. Numa perspectiva mais evidente, embora as letras apresentem temas da vida evangélica, a embalagem melódica e de arranjo reproduz os estilos musicais da moda e a indústria gospel imita o caráter de atração jovem e promoção musical da indústria fonográfica pop, estimulando o comportamento de baladeiro e fã por parte do jovem fiel.
Por último: o jovem religioso precisa se divertir. Ora, isso é elementar. Afinal, sem um pouco de lazer, recreação e leve entretenimento não há cristão que suporte o rojão contemporâneo. Contudo, quando a diversão deixa de ser um momento da semana para se tornar o estilo de vida, algo está se perdendo na caminhada, e este algo pode ser um sentido mais profundo do que é conversão. Se conversão significa mudança de direção, como ainda repetir os maneirismos de interpretação, a histeria fanática, as caras e bocas, os adereços e figurino dos artistas, as melodias e arranjos da música pop mais descartável da mídia?
“Haja entretenimento” – o mandamento da nossa sociedade do espetáculo passou a ser a palavra de ordem para a sobrevivência das igrejas na modernidade.
Comentários
vou colocar seu link no livre para pregar ok? beijos
Pretinhosexy: koe galerinha... essa cristoteca ficou muito show de bola msm quero logo q chegue dia 16 pois estou a fim de ficar com as pernas doidas novamente dancei pra kramba ontem. Fui galera...
Dudaofsurf: ae foi muito bom a festa ontem caraca dancei muito e louvei tbm mais so pelo “sangue do cordeiro”
precisa falar mais?
gilvan
na sociedade do espetáculo o que vale é o show da fé. obrigado por me linkar. tentei escrever um comentário no seu blog mas não consegui publicar. talvez se houver a alternativa "nome/url" seja mais fácil para os recém-alfabetizados na web como eu.
gilvan:
a matéria do JB entrevistou pessoas que se comunicaram de uma maneira mais "legível", é verdade. uma outra pesquisa poderá dizer se ambos os grupos representam a totalidade dos que foram ao evento.
no meu texto, a reação do público foi menos importante do que as técnicas usadas para influenciá-lo.
abraço a todos
não tinha visto esse texto ainda - fantástico. Apreciei muito a sua análise e, de certa maneira, as suas preocupações refletem as minhas. Penso que nós, adventistas e outros cristãos conservadores, deveriam não descuidar, porque a influência da pós-modernidade pode nos fazer perder o foco - talvez não quanto à adoção de ritmos "vulgares", mas no "relachamento" de critérios para a nossa adoração.
Mais uma vez, parabéns pela sua lucidez!