Definir o que é música tem sido uma tarefa bem movimentada para os enciclopedistas. O conceito é renovado periodicamente toda vez que um especialista vem a público ressemantizar a palavra. Na era dos blogs então...
Lisa Hirsch define: música é som organizado se movendo no tempo. Para Scott Spiegelberg, autor do blog Musical Perceptions , este é um conceito muito estrito, pois criaria problemas para as músicas de John Cage e toda a música aleatória.
Ele sugere que música é som considerado como arte. Esta definição permite considerar a canção dos pássaros e outros sons naturais como música, mesmo que não tenham sido “organizados”. Permite que o som da estática seja música, desde que alguém o perceba de um modo artístico (podem até chamar de música ruim caso suas conexões artísticas sejam demasiado tênues). Essa definição também remove o problema a respeito do criador musical, realocando a questão de definir música para o espectador.
O problema dessa definição, creio eu, está na classificação do conceito de arte. Primeiro, o conceito do que pode ser considerado arte está sempre em mutação, basta lembrar que aquilo que não era tido como arte pelos críticos parisienses do fim do século XIX, hoje é admirado por muitos como Impressionismo. Atualmente, o conceito de arte está tão dissolvido que qualquer curadorzinho “pós-pós-muderrrno” inflaciona o valor artístico de uma sala vazia – dirão que é um protesto contra o esvaziamento da arte no contexto da contemporaneidade enquanto locus viabilizante de elaborações refletidoras do humano e blábláblá. Que depois não reclamem que os museus estão servindo de abrigo para moscas.
Segundo, se toda a autoridade foi dada ao espectador para definir o que é arte, teremos então cada indivíduo como um hermeneuta pessoal dos atributos artísticos. Assim, qual seria o papel da crítica? Resenhar a programação do fim-de-semana do cidadão entediado, pois se o espectador vai ele mesmo apontar o que tem ou não valor artístico, sua interpretação é auto-suficiente e não precisará de nenhum especialista para indicar os modos de percepção da arte.
Se o espectador julga determinada obra com seu senso comum ou a partir de seu arquivo sonoro especializado, isso já não parece ser relevante. Se o espectador diz que tal música não pode ser chamada de música (tipo as reinações de John Cage ou Stockhausen), quem poderá contestar? Mas se o espectador diz não gostar dessa ou daquela música e pronto, estaria ele-nós, segundo o poeta Drummond, ao nível do gato que não gosta do sabor daquele leite e pronto?
Mesmo assim, nada como um concerto após o outro para que o conceito de arte dado pelo espectador se modifique. Em 1913, a Sagração da Primavera de Stravinski foi vaiada e nem chegou ao final da exibição. Isso é arte? Isso é música?, discutiam os atônitos espectadores. Foi só baixar a poeira dos assentos do teatro e a peça já estava sendo considerada uma obra-prima, o marco zero da música do breve século XX. Mas, e o juvenil espectador desprovido do contexto histórico da Sagração? E a gentil senhora acostumada a suspirar com a brancura do piano e do paletó de Richard Clayderman?
Por último, se o criador disser que sua obra é arte, quem poderá lhe contestar? Mas também, quem poderá nos defender?
To be continued...
Lisa Hirsch define: música é som organizado se movendo no tempo. Para Scott Spiegelberg, autor do blog Musical Perceptions , este é um conceito muito estrito, pois criaria problemas para as músicas de John Cage e toda a música aleatória.
Ele sugere que música é som considerado como arte. Esta definição permite considerar a canção dos pássaros e outros sons naturais como música, mesmo que não tenham sido “organizados”. Permite que o som da estática seja música, desde que alguém o perceba de um modo artístico (podem até chamar de música ruim caso suas conexões artísticas sejam demasiado tênues). Essa definição também remove o problema a respeito do criador musical, realocando a questão de definir música para o espectador.
O problema dessa definição, creio eu, está na classificação do conceito de arte. Primeiro, o conceito do que pode ser considerado arte está sempre em mutação, basta lembrar que aquilo que não era tido como arte pelos críticos parisienses do fim do século XIX, hoje é admirado por muitos como Impressionismo. Atualmente, o conceito de arte está tão dissolvido que qualquer curadorzinho “pós-pós-muderrrno” inflaciona o valor artístico de uma sala vazia – dirão que é um protesto contra o esvaziamento da arte no contexto da contemporaneidade enquanto locus viabilizante de elaborações refletidoras do humano e blábláblá. Que depois não reclamem que os museus estão servindo de abrigo para moscas.
Segundo, se toda a autoridade foi dada ao espectador para definir o que é arte, teremos então cada indivíduo como um hermeneuta pessoal dos atributos artísticos. Assim, qual seria o papel da crítica? Resenhar a programação do fim-de-semana do cidadão entediado, pois se o espectador vai ele mesmo apontar o que tem ou não valor artístico, sua interpretação é auto-suficiente e não precisará de nenhum especialista para indicar os modos de percepção da arte.
Se o espectador julga determinada obra com seu senso comum ou a partir de seu arquivo sonoro especializado, isso já não parece ser relevante. Se o espectador diz que tal música não pode ser chamada de música (tipo as reinações de John Cage ou Stockhausen), quem poderá contestar? Mas se o espectador diz não gostar dessa ou daquela música e pronto, estaria ele-nós, segundo o poeta Drummond, ao nível do gato que não gosta do sabor daquele leite e pronto?
Mesmo assim, nada como um concerto após o outro para que o conceito de arte dado pelo espectador se modifique. Em 1913, a Sagração da Primavera de Stravinski foi vaiada e nem chegou ao final da exibição. Isso é arte? Isso é música?, discutiam os atônitos espectadores. Foi só baixar a poeira dos assentos do teatro e a peça já estava sendo considerada uma obra-prima, o marco zero da música do breve século XX. Mas, e o juvenil espectador desprovido do contexto histórico da Sagração? E a gentil senhora acostumada a suspirar com a brancura do piano e do paletó de Richard Clayderman?
Por último, se o criador disser que sua obra é arte, quem poderá lhe contestar? Mas também, quem poderá nos defender?
To be continued...
Comentários
Quem dera cristãos espressassem musicalmente o amor conjugal com a beleza e riqueza que o conhecimento da Palavra de Deus poderia trazer à cultura popular....