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ateístas, graças a Deus

Pode ser qualquer dia, porque todo dia é dia de sair e irradiar a verdade. Eles vêm de dois em dois, irmanados num só ideal: o de falar do que descobriram. Eles batem na minha porta e me desejam bons dias e entregam panfletos e me perguntam da verdade e me dizem até mais ver e me deixam perdido em meus pensamentos.


Não sou profeta nem filho de profeta, mas não vai tardar e os ateístas protagonizarão essas cenas. Tal e qual um evangelista que apregoa de porta em porta, eles irão até sua casa lhe anunciar as novas da inexistência de Deus. O IDE deles já circula nos ônibus londrinos (foto): “Provavelmente não há Deus. Agora pare de se preocupar e aproveite a vida”.

Faltou colocar que “agora seus problemas acabaram”. O avivamento ateísta já não dispensa nem as táticas evangelísticas de publicidade nos veículos e logradouros públicos. Mas o “provavelmente” da frase deixa o destinatário da mensagem um tanto confuso. Afinal, o transeunte pode parar na rua para elocubrar sobre a função desse "provavelmente". Se provavelmente Deus não existe é porque estão lhe dizendo ao mesmo tempo que provavelmente Deus existe. E, sendo a rua o local onde circulam carros, motos e até ônibus com propagandas ateístas, o pensante se arrisca a sofrer um acidente e ainda culpar os organizadores do anúncio.

O mote ateísta inscrito nos ônibus generaliza os grupos religiosos como um bloco monolítico de infelizes que não aproveitariam a vida (enjoy the life). O que seria esse aproveitar a vida? Festas sem fim, baladas intermináveis, sexo casual, falar palavrões, assinar a Playboy, ir comprar pão usando o abadá do Chiclete com Banana, trespassar o nariz com piercing, se vestir como a Mulher-Melancia, gabar-se de dirigir alcoolizado na madrugada, gritar uhuuu por qualquer coisa?

Se isso for aproveitar a vida, obrigado, não.

Mas, para alguns, é muito conveniente que Deus não exista. Os hedonistas não teriam prestar contas de suas obras e de seu caráter e os humanistas não teriam a intromissão de um Deus pessoal em suas confortáveis vidas. No fundo, os ateus até aceitariam a existência de Deus, desde que Ele não lhes desse a carga do livre-arbítrio, mas somente paz e um cadinho de sofismas sobre os quais conversar.

Às vezes, os descrentes (e os crentes também) se assemelham àqueles adolescentes que fingem que seus pais não existem e se envergonham de apresentá-los aos amigos. Por isso, se diz que o adolescente é a vingança de Deus sobre as criaturas: "Farei um ser à imagem e semelhança do homem e que mais tarde negará a existência dele".
Atualização:
Alguns comentários abaixo expandem o pensamento contido nessa postagem, inclusive contestando alguns pontos do texto. Recomendo.

Comentários

Anônimo disse…
Muito bom!

Gosto muito da forma como você escreve, perfeito.

Parabéns!

Feliz Semana!

Lídia
joêzer disse…
agradeço a gentileza, lidia.
Anônimo disse…
Satirizando um pouco...

Chances de um ateu acreditar em Deus:

0% - Discutindo com alguém
20% - Atrasado para o trabalho
40% - Natal
60% - Sendo seguido pela polícia
80% - Quando não estudou para a prova
100% - Vendo futebol
Anônimo disse…
rsrs.
como diz um amigo (candidato a agnóstico), na hora do perigo não existe ateu.
Anônimo disse…
Lembre-se que o "aproveite a vida" não precisa ser necessariamente ações negativas... aproveitar a vida pode ser se sentir livre da culpa eterna, ter um relacionamento homossexual (talvez alguns ainda considerem isso algo negativo), dar uma educação laica aos filhos, usar roupas comuns, doar e receber sangue e apoiar a pesquisa com células tronco... e o melhor, acabar com todos os conflitos de origem religiosa. Seria demais, não acha?
joêzer disse…
amigo,
acho que poucos classificariam o debate sobre células-tronco como um "aproveitar a vida".
e os homossexuais talvez se ressentissem de apontarem seu modo de viver como "aproveitar a vida" (frase que tradicionalmente se usa para chamá-los de hedonistas incorrigíveis).
usar roupas comuns é aproveitar a vida? talvez vc se refira, como no caso de doar sangue ou não, à denominações religiosas extremamente sectárias e punitivas.

o problema talvez esteja no sentido que damos à expressão aproveitar a vida. O individualista exagerado diz que pdoe fazer tudo o que quiser e não dar conta a ninguém pois só está aproveitando a vida.

mas, certamente, como você bem mencionou, há ações positivas no que chamam de aproveitar a vida.

um abraço
Anônimo disse…
Excluindo os exemplos, é claro.
joêzer disse…
ainda penso que alguns dos exemplos que vc usou não estão relacionados a 'aproveitar a vida'.

entendo que a preocupação está relacionada principalmente ao fato da culpa, essa senhora desprezível.

mas o 'aproveitar a vida' para os cristãos é repleto de ações positivas assim como o "aproveitar a vida' dos ateístas inteligentes rejeita o hedonismo e a extravagância.

claro, sempre há ateístas/humanistas que desprezarão os valores morais e a liberdade de pensamento, quando deveriam ser os últimos a fazê-lo. e também há quem, em nome de Deus, despreze princípios e liberdades, quando devia ser o primeiro a conserva-los.

um cristão honesto dirá que após sua conversão é que realmente começou a viver uma vida livre e sem culpa. um ateu sério não dirá que a descrença na existência de Deus é que o leva a viver a vida sem culpa.

seu precioso comentário me levou hoje a escrever um outro texto no blog. dessa vez, alguns cristãos podem incomodar-se.
Tatsu disse…
Na verdade eu até acho engraçado agora essa abordagem, quem sabe daqui a pouco teremos programas ateístas na TV aberta, aí ao invés de ficar assistindo o R.R.Soares ou a "Nação dos 318 pastores" eu não passe por Atheist Existence (http://youtube.com/watch?v=JJxCFa8YmbQ) em meio a vinhetas com Dawkins chamando a galera para "sair do armário" (http://youtube.com/watch?v=gYdUcJQba2I).
Se não há ao menos deveria haver espaço para todos, não acha?
Sem necessidade de se desesperar e partir para loucuras do tipo: "Mas o “provavelmente” da frase deixa o destinatário da mensagem um tanto confuso. Afinal, o transeunte pode parar na rua para elocubrar sobre a função desse "provavelmente". Se provavelmente Deus não existe é porque estão lhe dizendo ao mesmo tempo que provavelmente Deus existe."
(Deus de Schrödinger ?)
=))

Quem sabe daqui a pouco não começamos o domingo de manhã assim: http://youtube.com/watch?v=WxvjMxDtuAQ

Abrindo espaço para todos, podemos não somente ensinar criacionismo nas escolas, talvez devamos ensinar tb Kardecismo, quem sabe as crianças não deveriam ler junto com Darwin, Exilados da Capela e o Livro de Urantia.

Aí cada um poderia escolher a teoria/religião/não-religião que mais lhe agradasse.

Só para concluir, não acredito que ensinar criacionismo na escola vá melhorar alguma coisa, acho que a qualidade do ensino tem mto a melhorar antes sequer de ensinarem teorias científicas decentemente, e qdo digo científica excluo o criacionismo, pois não vejo como dissociá-lo da religião, e religião, é religião, ciência é ciência.

;)

See ya
joêzer disse…
tatsu,
não partí para o desespero na minha frase, nem no texto. no máximo, consegui fazer uma ironia sem graça.
a sua, sobre ateístas na tv no lugar de rr soares (why not?) é bem melhor. mesmo.
Zázu Morani disse…
Não sou ateu, mas vou tomar parte ante ao elogio da loucura...

Primeiro: “Afirmo que ambos somos ateus. Apenas acredito num deus a menos que você. Quando você entender por que rejeita todos os outros deuses possíveis, entenderá por que rejeito o seu.” Stephen Henry Roberts

Segundo: “Os crentes não acreditam nas religiões e nos deuses dos outros. Os ateus também não.”

Ou seja, não percebem a si mesmos e ficam ambos os lados a degladiar-se ridicularmente. Um capricho pacional e carregado de preconceitos (dos dois lados), mas um lado que conheço bem, dada a minha obrigação (livre-arbítrio?) de aprender a olhar o outro como ímpio e pecador nos primeiros 16 anos da minha vida. Mas isso ainda merece meu respeito e admiração, pois é justo que sejamos ensinados na fé de nossos pais. Só esqueceram de ensiná-los que um filho é um indivíduo que tem cérebro e pode fazer escolhas diferentes das de seus pais.

Desafio aqui a quem quer que seja, que faça uma visita ao pai da garota que foi jogada pela janela do apartamento. Vá até a frente da delegacia, junto àquela turba de pessoas que querem linchá-lo. Entreviste as pessoas porque estão ali e pergunte a elas: você é ateu?
Não há ateus lá com pedra na mão para fazer a justiça de Deus. Se houver, qual será a proporção? de 100 pra 1? muito "PROVÁVEL". Está aqui o desafio, e posso ir junto para entrevistar. Espero estar errado, mas acho difícil.
Nas baladas aproveitando a vida?
A mesma proporção 99 católicos e etc(cristãos que creem em Deus) pra um ateu, no máximo.

Esse aproveitar a vida que você citou, aquela listinha de safadesas desapropriadas dá-se a ateus e não-ateus, e garanto que encontrarás a quantidade de não-ateus na proporção que eu mencionei. Vamos nas baladas pra provar? (está lançado o desafio)
Da próxima vez que encontrar um bêbado na rua pergunte a ele: Crês em Deus? (é triste)

Principalmente ao intelectual, não é possível que não se aperceba que a lei moral é válida para todos os homens, independente de sua religião ou não-religião. Como por caso eu li Kant, vou transcrevê-lo aqui.

"...Toda a gente tem de confessar que uma lei que tenha de valer moralmente, isto é, como fundamento duma obrigação, tem de ter em si uma necessidade absoluta; que o mandamento: "Não deves mentir", não é válido somente para os homens e que outros seres racionais se não teriam que importar com ele, e assim todas as restantes leis propriamente morais; que, por conseguinte, o princípio da obrigação não se há de buscar aqui na natureza do homem ou nas circunstâncias do mundo em que o homem está posto... ...preceitos baseados em princípios da simples experiência, e mesmo um preceito em certa medida universal, se ele se apoiar em princípios empíricos, num mínimo que seja, talvez apenas por um só móbil, poderá chamar-se na verdade uma regra prática, mas nunca uma lei moral.
...Pois que aquilo que deve ser moralmente bom não basta que seja conforme à lei moral, mas tem também que cumprir-se por amor dessa mesma lei.
...o valor do caráter, que é moralmente sem qualquer comparação o mais alto,consiste em fazer o bem, não por inclinação, mas por dever.
Ponhamos, por exemplo, a questão seguinte: - Não posso eu, quando me encontro em apuro, fazer uma promessa com a intenção de a não cumprir? ... ou seja, se é prudente, ou se é conforme ao dever, fazer uma falsa promessa...
...para resolver de maneira mais curta e mais segura o problema de saber se uma promessa mentirosa é conforme ao dever, preciso só de perguntar a mim mesmo: - Ficaria eu satisfeito de ver a minha máxima (de me tirar de apuros por meio de uma promessa não verdadeira) tomar o valor de uma lei universal (tanto para mim como para os outros)? E poderia eu dizer a mim mesmo: - Toda a gente pode fazer uma promessa mentirosa quando se acha numa dificuldade de que não pode sair de outra maneira? Em breve reconheço que posso em verdade querer a mentira, mas que não posso querer uma lei universal de mentir; pois, segundo uma tal lei, não poderia propriamente haver já promessa alguma, porque seria inútil afirmar a minha vontade relativamente às minhas futuras ações a pessoas que não acreditariam na minha afirmação, ou, se precipitadamente o fizessem, me pagariam na mesma moeda. Por conseguinte a minha máxima, uma vez arvorada em lei universal, destrui-se-ia a si mesma necessariamente.
Não é preciso pois de perspicácia de muito largo alcance para saber o que hei de fazer para que o meu querer seja moralmente bom. Inexperiente a respeito do curso das coisas do mundo, incapaz de prevenção em face dos acontecimentos que nele se venha a dar, basta que eu pergunte a mim mesmo: - Podes tu querer também que a tua máxima se converta em lei universal? Se não podes, então deves rejeitá-la, e não por causa de qualquer prejuízo que dela pudesse resultar para ti ou para os outros, mas porque ela não pode caber como princípio universal."
(Kant)

Logo, a frase do ônibus "aproveite a vida" não é nada dos absurdos que você citou. Porque?

É o ponto que insisto. A lei moral vale para todos. Demonstre isso para um crente e um ateu e ambos hão de concordar que há um princípio moral universal.
Logo, a sua lista para "aproveitar a vida" é carregada de preconceito ignóbil ensinada doutrinariamente na igreja (disso eu sei porque lá estive). E ainda tem coisas na sua lista que são mais de gosto pessoal do que propriamente ações imorais. Esse julgamento é detestável. Porque não gosto de sorvete de chocolate, quem gosta é um pilantra safado? Não, de jeito nenhum.
É urgente uma revisão espiritual para que o homem alcance Deus com o seu espírito e lave a alma de juizos aterradores e inocentes.

Deus é criador e mantenedor. É a providência estabelecida por uma lei perfeita. Um Deus individual eram os faraós e nabucodonosor. Estes, cheios de complexos exigiam louvor e adoração. Deus, o Deus mesmo que tudo criou não tem desses complexos, louvá-lo é compreendê-lo, é estar com ele numa relação sublime entre seres distintos e morais. Curvar-se a Deus (com o mesmo propósito dos súditos de um rei) caracteriza a falta de entendimento da natureza de Deus. Um Deus individual não é garantia de cumprimento de lei alguma, há um princípio moral!

O princípio moral é para todos. Antes do fato de Deus ser ou não ser, o homem precisa mesmo é de vergonha-na-cara. Não me venha com esse "aproveitar a vida" distorcido. Kant demonstra isso claramente. Creia ou não creia Nele, estamos todos sob um fundamento moral puro, racional e universal (e porque não inspirado por Deus?).

Raulison Mendonça
joêzer disse…
Este comentário foi removido pelo autor.
joêzer disse…
raulison,
acima deixei o seguinte comentário que talvez ficasse melhor no corpo da postagem. mas isso possivelmente evitaria os diálogos na caixa de comentários.

"entendo que a preocupação está relacionada principalmente ao fato da culpa, essa senhora desprezível.

mas o 'aproveitar a vida' para os cristãos é repleto de ações positivas assim como o "aproveitar a vida' dos ateístas inteligentes rejeita o hedonismo e a extravagância.

claro, sempre há ateístas/humanistas que desprezarão os valores morais e a liberdade de pensamento, quando deveriam ser os últimos a fazê-lo. e também há quem, em nome de Deus, despreze princípios e liberdades, quando devia ser o primeiro a conserva-los".

inseri agora no final do texto uma recomendação para que os leitores se animem a ler os comentários que, contestando alguns pontos do texto (ou mesmo todo o texto), relevam o debate.

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