O mundo da arte está cheio de espectador que se deixa levar pela aparência e acaba aplaudindo rótulos estabelecidos e descartando novidades. Seu julgamento fica preguiçoso e com ele só os grandes vultos da história têm vez. Por isso, escrevo-lhes essas parábolas pequenas, essas fábulas menores de moral mínima para correção dos gostos e justiça dos desprezados:
Durante um concerto, um pianista tocou uma peça do desconhecido Agostinho da Silva e outra do amado imortal Ludwig van Beethoven. A plateia, como são todas as plateias em todas as salas de concerto, era formada por três tipos de gente: os iletrados que batem palmas entre os movimentos de uma peça, os esnobes que fazem "shhhh" para quem aplaude na hora errada, e os deficitários de atenção que perderam a conta de quantos movimentos já foram tocados e esperam os outros aplaudirem primeiro.
Acontece que o pianista inverteu a ordem das peças. Tocou a música de Beethoven primeiro. E o público, ouvindo como se fosse de Agostinho da Silva, achou a peça insípida e inodora e um crítico reprovou o que lhe pareceu uma cópia barata do pré-romantismo alemão. Teve gente que aproveitou para ir ao banheiro.
Quando tocou a peça de Agostinho da Silva, a plateia, ouvindo como se fosse de Beethoven, achou a música calorosa e inovadora e um crítico ressaltou a atualidade do que lhe pareceu uma obra da última fase do gênio alemão. Teve gente que aproveitou para gritar "bravo!" pela primeira vez.
Moral mínima: o aplauso é para os famosos mortos, a vaia é para os famosos vivos.
A imagem acima é do site alcorngallery.com
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